segunda-feira, 4 de julho de 2011

Considerações sobre a velhice e o arcadismo

   Toda história, para ser bela, tem de ser verdadeira. E a minha verdade de hoje tem a beleza de uma antiga canção triste, de um ancião solitário depois de uma vida de humanidade farta e profana.
    A presença constante do vulto mórbido o acompanha sombriamente, à nuvem dos seus olhos opacos. Mas, às vezes, num lapso do presente, jorra às suas faces - a olhos vistos - o que se pode chamar de a mais empírica das recordações. E ele sente até o cheiro fresco de uma juventude distante. 
    Cansado da sua real condição atual, empenha-se em alienar-se no delírio efêmero d'outros tempos. E vive suas memórias, caduco chamado. É nesse instante que sua rouca voz canta aquela canção menos velha do que melancólica. Não me atrevo à pretensão de aqui tentar descrever a delicada beleza desse sentimento. a resignação é imposta pela força do tempo e por aquela presença sombria, invariavelmente pronunciada, mas calada pelas reações pseudo-otimistas dos parentes que lhe cuidam.
    A melodia, longamente pronunciada, chora em lamento, e a letra lembra uma amada de indizível candura, mãe perfeita, imaculável, amor eterno. Canta também a tristeza arrependida de não ter vivido o sentimento como hoje imagina que devia. Não se considera merecedor da sorte que teve à época e talvez por isso, por penitência do destino, hoje amarga a pior das dores: a culpa.

   Esses tempos que tenho vivido nada mais são do que o efêmero instante que dura a canção. Sinto que ele já acaba e eu volto à angústia citadina, numa saudade bucólica dos momentos condoreiros de que já começo a me despedir.
   Desde então, repito refrões e tomo fôlego para a estrofe final.

3 comentários:

Mazé disse...

Oi minha sobrinha linda! Táo jovem e com tanta sensibilidade e acuidade para perceber as coisas da vida e escrever essa crônica que me tocou tão fundo, pois sei o que você quer dizer. Um beijo grande.

Ilana Guimarães disse...

Ô, tia, muito obrigada! Você conhece mesmo a situação que me soprou esse texto... Acredito que falamos da mesma pessoa, por quem nutrimos um grande amor... distante.
Beijos.

Mazé disse...

Você é demais, garota..... Beijãozão