sábado, 30 de abril de 2011

Deixo para amanhã

Individualidade espontânea reprime-se, oprimida pelo imposto trabalho e pelas seduções brilhantes do entretenimento.
Saco...

Pós-modernidade

Admito (plágio talvez permitido): acho que estou ficando sentimentaloide mesmo. Hoje me emocionei assistindo a Leandro e Leonardo! O contexto pode ter sido favorável para isso (e é sempre): sábado, à noite, eu em casa, sozinha, comendo (de colher) um resto de brigadeiro duro da geladeira e tentando aproveitar os R$69,90 que me custa ter uma TV a cabo de que nunca consigo usufruir. Enfim, deu pra perceber como a coisa estava boa pra meu lado.
    Pois então, como dizia, cá estou eu, em pleno fim de semana que "bomba" no verão soteropolitano. Fico só, diante da TV e me emociono com a pieguice pura da música sertaneja. Achei bonito o modo como a dupla, despretensiosamente, cantava seu sucesso brega, com seu público ordinariamente apaixonado.
         Como passei a acreditar, só há estranhamento na arte com identificação e, inconsciente disso nesse momento, tive uma catarse (acreditem!) com a letra boba de um amor saudoso.
         É fato: pode não haver vanguarda, inovação, rebuscamento metafórico na cultura de massa, mas ela é inevitavelmente – como dizem seus representantes – “flecha de cupido” sobre qualquer um. Isso é que é interessante. Porém, é justamente essa fácil acessibilidade que a distancia daqueles que se julgam intelectuais: sempre querendo a “área VIP” (denominada “cena alternativa” ou “cult”), gente pretensiosa, que se considera queísticamente superior, não permite (ou não admite) que a comoção tome conta de si a partir de algo que atinge a tanta gente. é preciso ser diferente, pertencer ao universo “in” e, com um olhar desdenhoso e quase enjoado, afirmar que aquilo não lhe acrescenta nada... Na moral, minha gente, desde quando arte TEM que acrescentar alguma coisa? A arte pode despertar um olhar, um sentimento, um estranhamento, e cada um fará disso o que quiser e tiver capacidade.
         Chamo a música que ouvi de arte, sim, porque fui tocada por uma experiência estética. Permiti-me. Não quero achar que, para algo me atingir, seja necessariamente rebuscado e cheio de intertextualidades restritíssimas.
         Minha gente, parece que o Parnasianismo está voltando. Já chega disso, né? Desde 1922 se tenta derrubar essa visão tão limitada. Experiências catárticas acontecem sob várias sensações: desde a depressão amorosa (com Vinícius e Leandro & Leonardo) à libido (lindamente descrita por Clarice, mas visceralmente vivida e incitada por Léo Santana).
         Assim, voltemos ao mundo compartilhado. Torres de marfim são lindas, mas não precisam ser tão altas. Podemos descer ao play e carnavalizar, mortais que somos. Aliás, acho que, na verdade, esse é um desejo inconsciente, reprimido por uma vaidade social, que nos coíbe o arrepio dos pelos diante daquilo que nos identifica como iguais. Faz sentido?
         Ou é isso, ou eu tô ficando besta mesmo.
        
P.S.: Fica a dica: este texto foi inspirado em “Temporal de Amor” (Leandro e Leonardo) e “Desce” (perfeita de Arnaldo Antunes).

Pseudo-memória

Coisa doida é fotografia, pintura, representações que sejam. Não é que elas captam o sentimento, mas têm potência para provocar. Inquieta, a imagem sorri morta: "Ceci n'est pas une pipe". Mas nós, iludidos na falaciosa busca humana, enxergamos vida, vemos sombras e pensamos ser gente. Pensamos que, só porque há felicidade captada em flash, haverá possibilidade de retomá-la, senti-la de novo. Vemos, mais uma vez, um olhar que parece pôr pra fora qualquer sentimento, mas nem sabemos que até mesmo os olhares podem ser apenas imagens: atores da caverna.
Às vezes, não: translucidamo-nos. Deixamos aparecer nosso eu sincero (quase sempre involuntariamente, é claro - sorte dos que podem fazê-lo conscientes); como se, por um lapso, nos esquecêssemos das máscaras e nosso sentimento quisesse sair, pôr a cara no mundo, olhar bem nos olhos do grande mágico, aproveitando o desleixo da porta entreaberta.
Só quem já sentiu na pele as consequências de ter deixado (sem querer) um sentimento aparecer em uma fotografia sabe a raiva que dá no momento da re-ve-la-ção. Complicado. Não se pode esconder a cara num buraco: ela está lá, estampada, explícita, provando o que se queria esconder, flagrante de um milésimo de segundo.
Mas tudo bem. É assim que funciona. Acho que não dá para encenar o tempo inteiro. De vez em quando, alguém nos fotografa sem câmera, vê esses instantes de brecha para a alma e percebe, mas não tem como provar, ou rever. Mas, cá entre nós, são essas as fotografias mais verossímeis: contemplam, ao mesmo tempo, o olhar do outro e o nosso. Passam-se tempos e se pode retomar, desses álbuns incontritos e inconcretos, o que importa mesmo. Se é verdade ou não, só interessa a versão, lembrança, recordação. Afinal, se tudo é representação, valoremos aquilo de cuja construção fizemos parte.

Momento

Chega um momento
Em que o omisso grita.

Sufocamo-lo sempre
Mas seu sentido supera
Qualquer auto-ajuda.

Chega um momento
Em que o sonho, triste que seja,
Vil que surja,
Bruto que nasça,
Precisa se libertar

É quando, enfim,
Deparamo-nos com o que há de mais íntimo,
Aquilo que, de tão empurrado, escondido, abafado,
Impregnou-se tanto
Que sai com e como parte de nós
Como pedaço da nossa forma humana

O tosco busca sair,
Mas somos nós que o ruminamos todos os dias
Envergonhados, embora.

Mas eis que chega o momento
(inevitável instante da temida exposição)
E, expostos ao julgamento alheio,
Vomitamos um naco de nossas almas

Chega o momento
Em que é preciso olhar
bem no fundo dos grandes olhos do feitor.

É quando, enfim,
Nos livramos dele
Ou descobrimos, em sobressalto,
Que o castigo jamais existiu.



Prenhe-poética

Todo esse tempo
Essa aflita felicidade inquieta
Só tentou abafar o que era óbvio:
Estou grávida de poesia.

Com medo que os filhos me lembrem seu pai,
Esqueci a gestação
Que se seguiu silenciosamente involuntária.

E hoje descobri que,
sendo a dor parte do parto,
aceito-a,
ansiosa que estou de sentir a maternidade.

Os momentos de inspiração fecundinária
Virão inevitáveis nos olhos do rebento.
Mas ele é tão belo
Que consola a melancólica mágoa que me recorda.

Que venha a dor, mal de quem ama;
Que traga o choro, fruto dos ventres vazios;
Que chegue tudo o que sempre escondi
Por trás desse sorriso.

Quero que a verdade abafada dos travesseiros berre nas madrugadas
E eu, acordada, acalentando-a,
Possa amamentar-me de esperança
Para, quem sabe um dia,
Voltar a ser fértil.

Galope

Queria mesmo escrever uma carta. Sempre soube que era melhor no papel do que na voz.Parece que os acontecimentos conspiram conscientemente. O pensar positivo pode ser um iludir-se. É claro que é mais confortante pensar que “tudo tem seu momento”, mas é preciso tomar as rédeas da vida, um cavalo que não é livre, mas corre descontroladamente para onde lhe abrem um caminho tonto, desesperado, fugindo de si – rota de fuga. Escolha... De repente, depara-se com um grande  oceano em tempestade: a onda o toma e leva-o a mais uma trajetória desconhecida, na qual ele continua cavalgando, cada vez mais sufocado, em busca incansável pela perfeição do percurso, lamentando-se e  (des?)culpando-se a cada deslize fora da linha traçada pela grande força das águas. Quem dera a esse galope ter asas, chifre ou quem o governasse para tirá-lo desse afogamento agora inevitável. Talvez pudesse emergir e abrir os olhos no ar, encher o peito do mais puro ar do céu que toca o oceano na linha intocável: o sonho.

Há tempos...

Que seja assim então...Dias cheios, telefonemas, encontros
E a plenitude do vazio.
A saudade inunda de nadae a mente busca o preenchimento por ocupação.
Foco: Nego-ócio.
Sigamos em frente
Quem sabe isso acabeou se acomode, obrigado.
De nada.

Resposta

-Não sei se sabe que era de você que eu estava falando.
-Foi? Não percebi relação.
-A relação fui eu que fiz. De fato, não havia. Inventei.
-E o que quis dizer?
-Quis, não. Disse.
-Que seja, então. O que disse?
-Disse-me a você. Mostrei quem sou e o que quero.
-Mas pelo menos está lúcida: Você mesma disse que foi ilusão.
-Ilusão, não. Criação. Mas parece que errei de palavra. Você soa mais certo.
-Se ligue: eu não vou viajar na sua pieguice que indiretamente tenta me comover, achando que me seduz. Sendo duro e franco: acho que você cria expectativas demais. Relaxe. Tô bem como tô, aqui, buscando o que quero.
-Entendo. Mas não me importo com você, como está ou coisa do tipo. Na verdade, era importante ter um alvo para servir de inspiração, algo como uma droga, que você sabe que é alucinógeno, mas se preocupa apenas com o efeito. Entende?
-Não, mas tudo bem. Desde que você não me importune ou faça cara de criança chorona quando vir o que não quer.
-Se falar com você qualquer amenidade for importuná-lo, avise. Paro tranquila. E quanto à "cara de criança chorona", reforço: não é para você; é só efeito. Não desejo qualquer tipo de preocupação da sua parte, ok?
-Agora estamos conscientes.
-Eu sempre estive, só achei que não havia necessidade de grosseria. Mas tudo bem. Não me magoa sinceridade. Tenho consciência emocional (não tanta inteligência quanto você pensa que tem).
-Ok, então. Parece que chegamos a um nível ruim, mas tudo bem. Pelo menos esclarecemos tudo.
-Esclareci a você. O nível, para mim, é o de sempre. Mas saio disso, porque o que mudou foi meu interesse. Acho que agora, vendo você real, perdi a vontade de torná-lo ideal. Sempre foi uma personagem esférica em minha literatura, mas agora se mostrou totalmete plano e previsível. Preciso mudar de fonte. Cansei.
-Beleza então.
-Beleza.

(Ela volta para casa. Revê fotos antigas e sorri. Fecha seus álbuns e cadernos e seu clelular lhe lembra que tem hora marcada no salão)

Fim do primeiro ato.

O homem sem cabeça

http://www.youtube.com/watch?v=o538yb68hMA&feature=related
http://www.youtube.com/watch?v=EetfkJBogi8

O homem sem cabeça também tem vaidadeExpressar sentimentos, revelar emoçõesComo? Em que dar close?No peito.
Dançar sozinho o ensaio do encontroLembrar que o amor também sufocaPerder a cabeça eResgatar o sentimento atirado pela janelaNegar-se e buscar espelho no outro.
Amar e viver é muito perigoso.O amor é um bicho-de-sete-cabeçasque come nossos pensamentos e,por medo, cedemos.“E quem um dia ia dizer que existe razãoNas coisas feitas pelo coração?”
Anular-se, decapitar-seFoi a solução involuntáriaTenta-se atéSer o cabeça do espetáculoOu acostumar-se a ser um “cabeça pequena”.
Mas ou não se correspondeÀs expectativas do espectadorOu ao desejo do interior
Transeuntes não vêem a ausência (invisível)Ausência que também a eles preenche.
Todavia, nos lembremos:Temos mãos (e vamos de mãos dadas)Que se perca a ideologiaOu a busca da identidade (perdida?)Que nunca se encontra
Ceder apenas ao corpo, coração, peleIr embora sem por quêEsquecendo-se do euPara a infelicidade satisfatóriaDe viver pelo outro.Amor,

Nazuk

Quando Alice entra na toca do coelho, sente primeiramente uma recordação de acolhedoras antigas de ninar. Consegue inclusive ver de perto, ela bem pequena, as grandes mãos do piano que sua mãe lhe tocava nas noites quentes em que o sono vinha contra sua vontade.Já envolvida na penumbra do lugar, Alice percebe o clima favorável à dança. Sente o cheiro dos charutos soprados em pubs irlandeses escuros, em que uma jovem, embriagada pelo som, dança suavemente, sensualizada pelo batom vermelho: atraente e perigoso. Alice vê aquilo e sente que já não pode mais suportar  a vontade de adentrar aquele lugar, mesmo tomada pelo medo.Está caminhando pela selva escura e úmida. Só há a névoa azul-escura que a envolve e seduz. Do céu, ouve um apelo que a chama e alerta. Não consegue dizer não. É levada pelo canto da sereia que não a engana. Sabe que há o incerto, mas não consegue e segue. Sem cabeça (arte da rainha), Alice vai em busca do desconhecido, mergulha nas águas quentes e escuras de um mar sem chão.

Eu e a academia

Confesso: hoje sei o que é ser a pior aluna da classe. Em meus tempos de escola e faculdade, estava, muitas vezes, entre os primeiros; no máximo (ou no mínimo, a depender do ponto de vista), ficava na média. Mas nunca fui para a recuperação sequer. Filha de professora tinha de “dar exemplo”.Pois então, como dizia, sou hoje a pior aluna da turma. Onde? Na academia (não aquela sinônimo de meio acadêmico, mas a mais frequentada e quista: a de ginástica).Antes de começar, todo um ritual: comprar um tênis novo, bermuda de lycra e até um squeeze descolado. Toda paramentada, lá vou eu, buscar perder uns quilinhos e tentar, mais uma vez, me enquadrar aos padrões estéticos impostos pela sociedade capitalista ocidental, ou seja, queria ficar no “shape do verão”. Logo de início, mais uma daquelas constrangedoras avaliações físicas em que teoricamente se mede nosso percentual de gordura corporal; mas, na prática, a intenção é torturar os gordinhos com os beliscões daqueles aparelhos em formato de pinça apertando nossos pneuzinhos, como se dissessem: “viu no que dá levar tanto tempo para tomar vergonha na cara e vir aqui tomar uma providência?” Mas tudo bem, passamos pelo constrangimento inicial sem graves problemas e partimos para a malhação de fato, com boa vontade.Começa uma aula empolgante (!?) de Power Jump (parece que usam os nomes em inglês para tornar a coisa toda mais moderna, lúdica, atrativa)! Todo mundo em cima de suas caminhas elásticas e de frente para um enorme espelho com luz e tamanho suficientes para apreciarmos nossas fofas pelanquinhas saltitando mais do que o enlouquecido professor que berra sorridentemente: “Vai linda! Joga fora esse pneuzinho! Vá embora celulite!”Meu Deus, o homem tem a cara-de-pau de chamar de “linda” aquela para cuja celulites ele mesmo aponta do jeito mais indiscreto possível! Na moral, eu acho que não mereço esse discurso forçado de auto-ajuda, sério mesmo. Se era pra dar uma de Paulo Coelho, era melhor ficar calado. Mas tudo bem, eu persisto, finjo que não é comigo e me concentro na respiração para não fazer feio, tentando não parecer tão ofegante na frente das minhas colegas. Ô, minha gente, minhas colegas de academia! Essa é a pior parte! Além de quase todas terem os músculos definidíssimos (sinceramente, se eu tivesse um corpo daqueles, já teria deixado a academia há muito tempo: já tinha surtido efeito), conseguem seguir impecável e sincronicamente todas as mirabolantes coreografias inventadas pela mente criativa do professor que berra irritantemente, com um fôlego que não acaba nunca. Enquanto isso, eu procuro sobreviver àquela situação, errando absolutamente todos os passos e tropeçando em minhas próprias pernas! Aff! Mas... Tudo bem! Preciso superar. Para piorar, o professor (sempre ele!) em vez de fingir que não está vendo, de fazer de conta que não estou ali, prefere falar diretamente comigo: fica do meu lado e diz que o passo é fácil, repete: "1, 2, 3, 4... 1, 2, 3, 4". E eu lá, persistindo, disfarçando, querendo loucamente acertar para me desviar do foco das experts que se acabam lá na frente. Todavia, para variar, fico ainda mais nervosa e faço coisas piores. É... eu consigo me superar.Mas – de novo! – tuuudo bem, resisto e aprendo uma “opção facilitada” exclusivamente para mim, enquanto as outras saltam em perfeita sintonia entre si e a música. Terminada, enfim, a aula, não acaba o constrangimento: vamos pegar peso, mulher! Lá estou eu, levantando orgulhosamente um pesinho de dois quilos em cada mão, enquanto, ao meu lado, alguém que, na minha concepção, não tem mais motivo para tanto sacrifício carrega, sem piscar, mega alteres daqueles que parecem ser feitos com pneu de caminhão.Fugindo do espelho, olho para cima, para um restinho de parede todo “decorado” com homens e mulheres super sarados, suados e envoltos numa atmosfera, literalmente, sexy. Olho novamente a minha imagem no espelho e desconstruo de vez aquele discurso ( inventado para consolar gordo) de que seria ridículo alimentar a indústria da beleza. Gente, não há ideologia cabeção que resista a tamanha apelação! É demais para mim. Dou graças a Deus por meu amigo ter deixado de frequentar aquele lugar. Meu mico seria muito maior.Saio da academia questionando a teoria que afirma que o exercício físico proporciona bem-estar. Procuro um resquício que seja da famosa endorfina, mas só me sinto um Chris Rock. Agora sei como se sentiam meus colegas de escola que só sentavam no fundo da sala e me olhavam com raiva quando eu lia toda feliz mais uma das redações elogiadas pela professora. Nossa! Não sei como eles não me mataram, porque eu, hoje, pior aluna da academia, só não ataco com ódio as “gostosonas”, porque sei que basta um peteleco delas para eu cair dura, tremelicando as gordurinhas.Tudo bem, é assim que funciona. Sigo persistindo, falando mal das bonitonas por pura inveja (admito) e tentando compensar a falta – ou o excesso – de gostosura com outros dotes “acadêmicos” .